Se me vou casar em Abril tenho que começar a pensar no divórcio...
O caso da menina desaparecida no Algarve, que felizmente me parece estar muito perto da resolução, acabou por afastar as atenções de uma, muito interessante, discussão na Assembleia de República, que por esta altura andaria nas bocas de muito boa gente...
Li um artigo, que transcrevo em baixo, e com o qual concordo completamente... É um bocado extenso, pelo que, desde já, peço desculpa ao Pardal que detesta ter mais que 5 ditongos para ler, mas acho que vale muito a pena!
Gostava muito de saber as vossas opiniões!
A guerra das rosas
A proposta do Bloco de Esquerda para a aceitação legal do divórcio unilateral causou grande indignação. Se alguém não quer continuar casado pede o divórcio sem ter de explicar as razões, defende o projecto. Para mim faz sentido. Se para casar é preciso o consentimento dos dois, sem ter de dar explicações, não vejo porque deva alguém perder esse direito depois do casamento. Os dois tipos de divórcio aceites em Portugal (litigioso e por mutuo consentimento), ao contrário do que li por aí, continuam a existir na proposta apresentada. Apenas se dá, a quem está casado e assim não quer continuar, o direito a divorciar-se sem apresentar nenhuma razão e sem ter de esperar pela aceitação do outro. «Apenas porque deixou de amar?» Apenas? A mim parece-me razão mais do que suficiente.
Hoje, a única hipótese de divórcio não litigioso (ou seja, em que não se justifique o divórcio com a culpa do parceiro) quando não há mútuo consentimento é a separação de facto por três anos, mantendo-se as duas pessoas, para todos os efeitos patrimoniais e pessoais, casadas, o que é um absurdo. Nesses três anos o separado não pode refazer a sua vida sentimental. É uma espécie de pena suspensa. No fim, a sua culpa será analisada e a “pena” ditada.
À proposta agora apresentada chamaram, como se tal devesse causar escândalo, "divórcio a pedido". Pois para mim, tal como o casamento, o divórcio deve acontecer a pedido. É que para bailar são precisos dois...
A ideia de que só pode haver divórcio havendo mutuo acordo ou que, não havendo, se tem de culpar o outro pelo nosso desamor, é aberrante. Mas o raciocínio é simples: o casamento é um contrato para a vida. Para denunciar o contrato será preciso ou alguém ter violado os pressupostos desse contrato ou as duas pessoas estarem de acordo com o seu fim. O erro é este. O casamento não tem de ser um contrato para a vida. E para que ele termine deveria bastar que uma das pessoas não se sentisse bem no lugar que ocupa. Na realidade, a esmagadora maioria dos casamentos acaba por isso mesmo. Alguém deixou de amar. Não vejo onde possa haver escândalo quando a lei aceita a realidade.
Haverá problemas para resolver: divisão de bens, garantia de que a pessoa que se sacrificou mais pelo casal não fica financeiramente prejudicada, etc. O projecto define que o tribunal decida sobre matéria de pensões não tendo a “culpa” como critério, mas a necessidade e o contributo (não apenas financeiro) de cada um durante o casamento. A divisão de bens é tratada em separado, não dependendo dela a aceitação do divórcio. Para haver pedido unilateral, quando existem filhos menores, a regulação do poder paternal tem de estar ou resolvida ou tem de ser requerida por quem pede o divórcio, sendo tratada à parte. A regulação do poder paternal e a divisão de bens não poderão assim ser usadas como forma de pressão para “dar” ou não o divórcio, e vice-versa. Poupam-se os menores ao jogo sujo e os adultos à chantagem.
A aceitação do divórcio não deve depender da culpa e quem deixou de amar não tem de ser penalizado, como se tivesse cometido um crime. Há que arbitrar com sentido de justiça, o que nem sempre implica castigo.
O que não faz sentido é a situação actual, em que a lei fomenta o conflito num momento que é, já por si só, doloroso. A actual lei aplica ao casamento a lógica de qualquer contrato, mas acrescenta-lhe obrigações morais que nada têm a ver com o património (como o da fidelidade). Ou seja, aplica a sentimentos a lógica das obrigações contratuais. Das duas uma: ou ao casamento exige-se apenas obrigações patrimoniais e financeiras ou se reconhece a sua natureza excepcional entre os contratos legais. E se assim é, aceita-se que o fim do amor, do afecto ou até do respeito são razões mais do que suficientes para pôr fim ao casamento sem que nenhuma das partes tenha de ser considerada culpada. Ou seja, aceita-se o que todos nós sabemos: que nenhum casamento pode sobreviver contra a vontade de uma das partes.
Dar este passo é ajudar a pacificar os divórcios e evitar situações insustentáveis em que casais desenvolvem, apenas por razões legais e patrimoniais, ou seja, apenas porque a lei os leva a isso, relações de puro ódio, muitas vezes fazendo dos seus filhos, quando eles existem, e de todos os que os rodeiam vitimas de vinganças e de guerras de nervos. Pode custar a quem não aceita a liberdade alheia, mas o divórcio pode ser, em determinado momento, a melhor notícia possível. Que não seja o Estado a impedir a felicidade de cada um. Nada disto corresponde a uma intromissão do Estado na vida a dois. Pelo contrário. Significa que o Estado se recusa a castigar o fim do afecto, ou seja, a intrometer-se no que de mais intimo existe nas pessoas.
Dirão que este é um ataque à instituição do casamento. Para responder a isso teria primeiro de saber o que quer dizer hoje essa instituição. Provavelmente quer dizer coisas diferentes para pessoas diferentes. Mas se alguém a vê como uma imposição legal para a defesa da indissolubilidade da união entre um homem e uma mulher, e por isso defende que se dificulte o divórcio, tem todas as razões para ver esta proposta como um ataque. Primeiro, porque não é esse o papel do Estado. Segundo, porque seja qual for a lei as pessoas divorciam-se na mesma. Apenas se magoam mais e magoam mais os que as rodeiam apenas para que o Estado continue a defender um valor que está longe de ser aceite pela generalidade da população.
O divórcio unilateral existe na Suécia, na Noruega ou nos EUA (desde 1969, na Califórnia, através de uma lei assinada por Ronald Reagan como governador, que permite o divórcio unilateral com um compasso de espera). Na Alemanha o divórcio litigioso foi abolido em 1976. Em Espanha, onde o divórcio só é legal desde
Apesar de ser contra o excesso de facilidade no divórcio para que não seja um acto «um acto precipitado e leviano» (já eu sou dos que acham que as pessoas têm todo o direito a serem precipitadas e levianas com os seus sentimentos), o Bastonário da Ordem dos Advogados mostrou-se mais sensível à realidade: «a via para que aponta o projecto merece, pelo menos, ser estudada (...) É demasiado penoso para um cônjuge que não queira estar casado ter que assacar ao outro uma culpa para se divorciar».
Os estudos demonstram que a mera possibilidade de divórcio unilateral aumenta o poder negocial de cada um dos parceiros durante todo casamento, diminui o suicídio feminino e diminui a violência doméstica.
Cheira-me que, como no passado aconteceu com a actual lei do divórcio, muitos dos que hoje se opõem na política a esta lei serão, caso ela venha um dia a ser aprovada, os primeiros a usa-la. Com toda a naturalidade. Para serem felizes. Fazem bem.
1 comentário:
Só tive paciência para ler até meio.
No geral concordo. Para dançar são mesmo precisos dois. E hoje é muito dificil que duas pessoas estejam em sintonia durante vários anos. Penso aliás que sempre o foi, no entanto, como somos um país em "inho" (pequenininho, atrasadinho...fraquinho em muita coisa) e como a moral e as aparências sempre por cá ditaram lei, os casamentos iam-se arrastando.
Faça-se, pois, tudo para que as relações sejam o melhor que possam ser, enquanto têm sumo para durar. Depois, quando já não estiver a funcionar para um dos lados, haja maturidade e respeito na ruptura e, se possivel, que se mantenham boas memórias e uma amizade.
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